Joseph Ratzinger: avaliação do papa teólogo. Artigo de Jesús Martínez Gordo

Fotos: Religión Digital

04 Janeiro 2023

O artigo é de Jesús Martinez Gordo, presbítero da Diocese de Bilbao e professor da Faculdade de Teologia de Vitoria-Gasteiz e do Instituto Diocesano de Teologia e Pastoral de Bilbao, publicado por Religión Digital, 01-01-2023.

Eis o artigo.

O número e a entidade dos temas elencados mostram não só a oportunidade de contextualizar tanto a contribuição teológica e espiritual quanto a gestão eclesial de Joseph Ratzinger – Bento XVI, mas também a necessidade de recordar, com empatia e crítica, algumas dessas linhas de força maior que ele estava muito ciente enquanto era papa.

1) Avaliação de suas linhas de força teológicas e espirituais

São, em particular, as que se referem à relação entre revelação e tradição, assim como entre a sagrada escritura e o magistério. Isso é algo verificável, por exemplo, na centralidade que deu à sua singular interpretação do evangelista João.

1.1) A centralidade de Juan

É verdade que em sua cristologia, gestão eclesial e magistério papal foram abundantes as referências aos sinóticos, mas também que eles não ocuparam a posição central que finalmente foi concedida a João. E foi porque o quarto evangelista enfatiza a lembrança e a memória, algo capital para um platônico e agostiniano. A recordação de que fala João, sustentou Bento XVI, não é resultado de um mero processo psicológico ou intelectual na esfera privada, mas um acontecimento eclesial que, guiado pelo Espírito Santo, transcende a esfera propriamente humana do entendimento e do conhecimento, mostra a coesão entre Escritura e realidade e nos guia para toda a verdade.

San Juan Evangelista | Foto: Religión Digital

Consequentemente, o quarto evangelista deixou aberto a cada época e geração, graças ao entendimento na memória, um caminho para uma compreensão melhor e mais profunda daquela verdade. É um caminho que, indo além da historicidade dos acontecimentos e das palavras, nos introduz “naquela profundidade que vem de Deus e a Ele conduz”, ou seja, “nos mostra verdadeiramente a pessoa de Jesus, tal como foi”, e por isso nos mostra Aquele que não só era, mas é; Aquele que, em todos os momentos, pode dizer na forma presente: 'Eu sou' 'Antes que Abraão existisse, eu sou' (Jo 8, 58). Este Evangelho nos mostra o verdadeiro Jesus e podemos usá-lo tranquilamente como uma fonte de Jesus.

Como se vê, a referência à história de Jesus tem uma importância secundária a permanecer, articulada a partir do primado da "memória" viva em que ela nos alcança. Joseph Ratzinger estava em sintonia com seus professores Santo Agostinho e São Boaventura e seu amigo H. Urs von Balthasar, embora tenha apontado na ocasião – com razão, a propósito – que uma fé que esquece a dimensão histórica se torna "gnosticismo" porque negligencia a carne, a encarnação e a verdadeira história.

Neste compromisso com o Quarto Evangelho, não só reapareceram na biografia teológica de Joseph Ratzinger referências tão importantes, como a ligação entre conhecer e recordar, história e fé, Espírito Santo e magistério, ou revelação e tradição, mas também possibilitou explicar, entre outros pontos, sua concepção sobre "a" Verdade e sua posição favorável à chamada exegese canônica.

1.2) Verdade e evidência

Há outro ponto subjacente que percorreu toda a administração eclesial, o pontificado e a biografia teológica de Joseph Ratzinger do começo ao fim: sua paixão por mostrar a capacidade sedutora de Jesus, a verdade por excelência.

Bento XVI sempre teve um interesse particular em discutir a relação entre verdade e evidência. Sua saída da neoescolástica e seu estabelecimento agostiniano encontraram aqui uma explicação correta. Não é de estranhar que sublinhe o lado espiritual de alguém que se apresenta – para escândalo de judeus e estrangeiros – não só como “o caminho e a vida”, mas, sobretudo, como “a” verdade. E que o fez reivindicando para si a evidência de toda a beleza e da capacidade de sedução e fascínio que lhe é própria.

Esta é uma ênfase legítima que tem uma tradição frutífera e rica na história da teologia. Mas é uma perspectiva entre outras possíveis, igualmente enraizada na tradição cristã.

Há, por exemplo, outros mais atentos a mostrar que a verdade de Deus consiste precisamente no seu amor e, de modo particular, na sua associação aos crucificados deste mundo. São cristológias que mostram amplamente que o seguimento de Jesus se “verifica” (isto é, torna-se verdadeiro) estando com os bem-aventurados com os quais decidiu livremente identificar-se, por puro amor; e com quem continua a ser hoje, sem deixar de ser, por isso, conforto para uns e aguilhão para outros.

A concepção que Bento XVI tinha da verdade explica por que em suas referências aos Santos Padres não destacou devidamente um fato indiscutível para eles: que os pobres são os "outros Cristos" e que em tal verdade reside uma identificação desconcertante, capaz de para comover a todos, começando pelos próprios padres gregos e latinos, seguindo quase todos os santos e místicos e continuando com as pessoas de boa vontade de todos os tempos.

É verdade que esta compreensão da verdade é assombrada pelo risco do “ateísmo cristão”. Mas não é menos verdade que a perspectiva marcadamente platónica e agostiniana a que se subscreveu Joseph Ratzinger devia evitar os riscos do docetismo ou do intelectualismo e do espiritualismo desencarnado e cego. Em suma, o "gnosticismo" que ele denunciou corretamente em sua cristologia e em outros textos anteriores e posteriores.

São Mateus | Foto: Religión Digital

Poucos contestam que Mt 25, 31 e 1 João 4,8 são dois textos com força indubitável para marcar a teologia de todos os tempos. Sempre foi assim, com a dramática exceção do século 19 e parte do século 20, época em que a Igreja, ocupada em curar as feridas causadas pela perda dos Estados Pontifícios e sacudir a interferência dos poderosos deste mundo, acabou negligenciando a centralidade dos pobres e permitiu que o marxismo se apropriasse violentamente de tal verdade.

Desde então, uma parte da Igreja Católica teve enormes dificuldades em diferenciar a roupagem inaceitavelmente violenta e autoritária da reivindicação marxista da raiz radicalmente evangélica que esvoaça em sua defesa do proletariado e, por extensão, dos pobres e marginalizados do mundo. E, em consequência disso, tem tido dificuldades em superar uma concepção paternalista ou meramente assistencialista da pobreza e abrir-se a uma consideração estrutural da mesma. Isso ficou evidente na biografia teológica e na gestão eclesial de Joseph Ratzinger. Uma legítima e argumentada prevenção contra o marxismo triunfante durante seu tempo como professor e bispo parecia ter se tornado, uma vez derrotado ideologicamente com a queda do muro de Berlim, em um preconceito impossível de superar.

Teria sido desejável que, sem renunciar a uma crítica oportuna às manifestações contemporâneas do pelagianismo, tivesse acompanhado essa crítica com semelhantes precauções face às variantes correntes do docetismo (no fundo, uma confissão de palavras sem coerência de vida ou experiência mística). Este é também um dos erros mais difundidos e dissolventes que ameaçam a fé cristã nos nossos dias e sobre o qual falta uma reflexão crítica na sua biografia teológica e na sua gestão eclesial. Pelo menos tão contundente e insistente quanto a que ele fez do pelagianismo ou "ateísmo cristão".

Se assim procedesse, a verdade manifestada em Jesus teria se manifestado em todo o seu alcance e com todas as suas consequências; evidenciando sua inquestionável capacidade de seduzir e, também, escandalizar, neste caso, os poderosos do mundo.

Foto: Religión Digital

1.3) Desconfiança da exegese histórico-crítica

Jesus Cristo foi apresentado nos anos trinta – afirmou Bento XVI – a partir dos Evangelhos, pelo que, através do homem Jesus, Deus se tornou visível e de Deus se pôde ver a imagem do homem autêntico. Nos anos cinquenta surgiu o debate sobre o afastamento entre o Jesus histórico e o Cristo da fé. E o fez de mãos dadas com a pesquisa histórico-crítica: que sentido poderia ter a fé em Cristo se o homem Jesus era tão diferente de como os evangelistas o apresentaram e de como a Igreja o anuncia a partir dos Evangelhos? Iniciou-se um processo de reconstrução do Jesus histórico que tinha mais a ver com a biografia de seus autores do que com o próprio Jesus.

A consequência de tudo isso foi – gostava de diagnosticar Joseph Ratzinger – um Jesus histórico cada vez mais afastado de nós porque na realidade sabemos muito pouco sobre Ele. Nessa onda estava R. Schnackenburg, para quem só restava a história das tradições. redações.

Esta conclusão, declarou Bento XVI, é "dramática para a fé" porque a deixava sem referência certa e a relação com Jesus corria o risco de se sustentar no vazio ou, no melhor dos casos, nas ocorrências do exegeta de plantão. A Bíblia foi incapaz de falar do Deus vivo e espalhou-se a convicção de que, quando abordamos a Escritura e a comentamos, na verdade estamos falando de nós mesmos. Pior ainda: estamos decidindo o que Deus pode fazer e o que nós mesmos queremos ou devemos fazer.

Esta forma de abordar a Escritura acabou por sequestrar a comunhão de Jesus com o Pai. Nela consistia a singularidade do Jesus histórico. Sem ela não era possível entender nada. E só a partir dela tudo poderia ser compreendido, mesmo em nossos dias.

Livro La biblia: entre historia y teologia: la exégesis canónica de B. S. Childs, de Arthur Sanecki | Foto: Religión Digital

La “lógica católica”

A contundente avaliação que Joseph Ratzinger formulou da exegese histórico-crítica (e das consequências que ela acarreta) nos leva a lembrar, mais uma vez, a extrema importância de priorizar a chamada lógica "católica" sobre outras leituras excessivamente marcadas da Escritura. por biografias pessoais ou por legítimas – mas frequentemente limitadas – acentuações particulares.

Desde os tempos de Pseudo-Dioniso sabemos que qualquer teologia que se preze deve cuidar da encarnação do Filho e da ressurreição do Crucificado. Sabemos também que a riqueza do mistério que nos é dado em Jesus Cristo só pode ser balbuciada mantendo no equilíbrio instável – típico de todo pensamento "católico" – aquelas verdades que para um pensamento racionalmente estreito são percebidas como contraditórias ou impossíveis articular: Jesus e Cristo, transcendência e imanência, revelação e história ou Escritura e tradição.

E também sabemos que a pluralidade dos discursos teológicos é consequência de abordar um mistério que excede nossas capacidades compreensivas e também de adotar diferentes pontos de partida: não é o mesmo abordá-lo a partir de preocupações verdadeiras do que de preocupações estéticas ou amorosas. Em todo caso, para que qualquer abordagem seja efetivamente "católica" terá que integrar as verdades às quais outras perspectivas são mais sensíveis e estar muito consciente, ao mesmo tempo, dos riscos que cercam a perspectiva adotada.

Com seu empenho na "exegese canônica" Joseph Ratzinger partiu, como agostiniano que era, do Cristo da fé e dele se dirigiu ao Jesus histórico: "Eu só procuro, além de meras interpretações histórico-críticas, aplicar os novos critérios metodológicos, que nos permitem uma interpretação propriamente teológica da Bíblia e que exigem fé, sem querer e poder renunciar de modo algum à seriedade histórica”. É uma legítima perspectiva teológica e espiritual, atenta à iluminação interior que vem do alto e pronta a contemplar com fascínio o mistério divino.

Aparição de Cristo | Foto: Religión Digital

O Cristo da fé foi o ponto de partida axiomático de sua teologia e espiritualidade

Cristo, Joseph Ratzinger chegou a dizer, ou "é levado como um louco ou seguido como um louco". É um cristão que se deixou seduzir pela contemplação de um mistério capaz de iluminar todos os âmbitos da existência. Quando isso acontece, o cogito ergo sum cartesiano torna-se um cogitor ergo sum "católico" ("sou pensado em Deus, logo existo").

Esta é a louvável preocupação que pulsa em seu compromisso com a “exegese canônica”. “Somente a partir de Deus o homem pode ser compreendido e somente se ele vive em relação com Deus, sua vida se torna justa. Deus não é um desconhecido distante. Ele nos mostra seu rosto em Jesus; em suas ações e em sua vontade reconhecemos os pensamentos e a vontade do próprio Deus”.

O risco do subjetivismo

Mas, como qualquer aposta, apresenta -se analisada à luz da história da espiritualidade- limitações indubitáveis. E não menos importante é sua propensão a favorecer interpretações “eisegéticas”, ou seja, projetos de desejos e significados alheios – e até conflitantes – com o Jesus da história.

Para que o recurso a Cristo não acabe por se tornar a procura de um analgésico, de um placebo, de um hippie fascinante, de um pós-moderno devidamente egocêntrico ou de um fiel mais dócil à autoridade eclesial do que à palavra do Mestre, é necessária a referência do Crucificado, do Jesus histórico. Graças a Ele sabemos, por exemplo, que nosso centro é “excêntrico”, ou seja, que acontece fora de nós, de nossa subjetividade, desejos, aspirações, ilusões e que se atualiza no crucificado deste mundo.

Crucificação de Cristo: Religión Digital

Por isso, é preciso lembrar que, junto com essa perspectiva legitimamente promovida por J. Ratzinger, existe aquela que, partindo do Jesus histórico, se aproxima do Cristo. E, aproximando-se dele, evita o risco masoquista que envolve todo o seguidor que se mantém unicamente na contemplação do Crucificado. É a perspectiva em que se empenhou boa parte dos exegetas e teólogos católicos, desde E. Käsemann, que deixou claro, com Bento XVI, que o Jesus do querigma ou confessado e pregado é mais do que o Jesus histórico, mas também que o Jesus histórico deve continuar a ser o critério último da identidade cristã e de toda a cristologia; como foi para Paulo, os evangelistas, o redator da carta aos Hebreus e do Apocalipse.

Esta circularidade entre Cristo e Jesus desde o primado da história é algo – recordam estes teólogos e exegetas – que sobreviveu ao longo da história da Igreja, apesar de a tradição cristã nunca ter considerado conveniente canonizar a história de Jesus.

E se não bastasse este argumento sobre a primazia do Jesus histórico sobre o Cristo da fé, devemos lembrar que é o critério reivindicado pela Declaração "Dominus Jesus" (2000) em seu diálogo crítico e interessante com aquelas posições que tornam da máxima "Jesus separa, o Espírito une" o axioma configurador de sua perspectiva. João Paulo II confirma com razão que o Espírito de que falamos e ao qual nos referimos é o Espírito de Jesus, o ressuscitado dos mortos, isto é, o Espírito histórico.

Portanto, ir "além" dos dados históricos que Bento XVI legitimamente reivindicou com base na "exegese canônica" é obrigado a passar, mais cedo ou mais tarde, pelo cadinho do Jesus histórico, o Crucificado que se atualiza no crucificado. mundo. É este crisol que evita incorrer no indicado risco “eisegético”, com os espiritismos, subjetivismos e manipulações de que os santos e místicos incansavelmente alertavam. Entre eles, Santa Teresa e Santo Ignacio.

Santa Teresa e Santo Ignacio | Foto: Religión Digital

O santo basco diz na sua autobiografia que aprendeu a renunciar às "grandes novas e consolações espirituais" e às "novas inteligências das coisas espirituais e dos novos gostos", em particular, quando vinham a ele em horas de sono ou de trabalho, porque lhe impossibilitavam de fazer o que tinha de fazer.

E o místico castelhano escreve que "é uma falta de humildade querer receber o que nunca mereceu", que "é muito certo ser enganado ou em perigo", que ninguém tem a certeza de que este caminho é o caminho certo que lhes convém e que “a própria imaginação, quando há um grande desejo, vê o que quer que seja”.

Portanto, vale lembrar, nesta ocasião por Jon Sobrino, que a cruz de Jesus é o fato definitivo que critica todos os absolutos (e métodos teológicos) porque não é e não pode ser um absoluto.

Esta é a pendência da "exegese canônica" aplicada por Joseph Ratzinger em sua cristologia e muito presente em seu pontificado, ainda que em seu magistério se façam repetidas revisões da dramática situação do continente africano. No entanto, foi uma referência que acabou por não moldar a sua perspectiva teológica e que se baseou quase sempre num diagnóstico mais religioso e cultural do que político ou económico.

O significado expiatório e sacrificial da morte de Jesus

Finalmente, Joseph RatzingerBento XVI optou por uma interpretação sacrificial e expiatória da morte de Jesus, apoiando-se na oração sacerdotal do Nazareno no Evangelho de João, na coincidência cronológica (altamente questionada) da morte na cruz e na sacrifício do cordeiro pascal pelas mãos dos sacerdotes hebreus e na identificação entre a destruição do corpo de Jesus e a do Templo de Jerusalém.

Crucificação | Foto: Religión Digital

Ao propor esta interpretação expiatória, ele não só estabeleceu uma relação íntima entre a morte de Jesus e os antigos sacrifícios, mas também reconheceu estes últimos como a forma ou o tipo e Jesus como a plena realização do que é executado simbolicamente na liturgia do Antigo Testamento. Argumentando desta forma, corre-se o risco de submeter o “novo” sacrifício ao “velho” e fomentar a compreensão da entrega de Jesus como um simples culminar (quando não, um mero prolongamento) dos sacrifícios do Antigo Testamento.

A preferência de Joseph Ratzinger – Bento XVI pela interpretação sacrificial e expiatória da morte de Jesus (com os riscos que ela apresenta) foi coerente com sua compreensão dos escritos do Novo Testamento como transmissores de uma única e compacta visão teológico-histórica. Foi esta convicção que o levou a procurar uma cristologia unívoca, ou seja, uma forma substancialmente idêntica de apresentar a "figura" e a "mensagem" de Jesus, contando, para isso, com a centralidade que atribui ao Evangelho de João e com o auxílio da exegese canônica. Os sinóticos estavam sujeitos à verdadeira autoridade que Joseph Ratzinger Bento XVI concedeu a João.

Obviamente, é uma reivindicação legítima, mas excessiva. Sobretudo porque vem de quem vem e levando em conta a tendência de alguns setores eclesiais de erigir as opiniões teológicas do sucessor de Pedro em verdades inquestionáveis ​​e magistério irrefutável. É preciso lembrar – diante de tais leituras – que no próprio âmago da “lógica católica” reside a consistência de outras abordagens possíveis. A melhor prova disso foi – ainda que criticamente – a problemática aposta de Joseph RatzingerBento XVI pela interpretação sacrificial e expiatória da morte de Jesus.

2) Avaliação da sua gestão como prefeito e como Papa Bento XVI

Mas Bento XVI, além de teólogo, foi também um Papa que, fortemente condicionado quer pelas suas opções teológicas e espirituais, quer pelos diagnósticos acima delineados, adoptou toda uma série de decisões que foram e continuam sendo objeto de críticas bem fundamentadas.

Como já mencionei, a primeira de suas encíclicas sobre o amor de Deus (“Deus caritas est”) foi muito bem recebida. Muitos ficaram agradavelmente surpresos com seu tom proativo, quase a antítese do autoritário -e até polêmico- usado pelo Cardeal Joseph Ratzinger durante seu mandato como prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. No entanto, uma vez que as surpresas iniciais diminuíram, ficou claro que muitos diagnósticos e posições pessoais em seu tempo como Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé -e mesmo de tempos anteriores- mais cedo ou mais tarde terminaram, em decantações doutrinárias e decisões jurídico-pastorais, altamente questionáveis; e, às vezes, nos antípodas do que foi aprovado pela maioria no Concílio Vaticano II e ratificado por Paulo VI.

Limito-me a rever, por razões de brevidade, algumas delas:

Epílogo

Resta olhar para sua etapa como Papa emérito, suas promessas de não interferir no governo de seu sucessor, dedicar-se à oração e permanecer calado; às manipulações a que foi submetido e ao seu descontrole, por vezes surpreendido por elas; às suas afirmações, nem sempre alegres, mas coerentes, em todos os momentos, com as opções teológicas e dogmáticas que tentei rever nestas linhas e um longo etc.

É uma tarefa que fica para outra ocasião e momento.

Descanse na paz do Deus misericordioso, a Verdade que continua a confortar e estimular aqueles de nós que esperamos um dia encontrá-la, como já fez nosso irmão Joseph Ratzinger – Bento XVI.

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